O poder da palavra: sem ela não nos conectaríamos com o que há e também para dizer o que não há. Precisamos das palavras para expressar o que surge, o que brota e o que se vai e se esvai.
As coisas todas em seu ser convidam e permitem que delas se fale. Considere isso: quem delas fala, quem exprime os seres em seu vigor?
Isso se dá por nossa ação, nosso fazer e nossas técnicas que transformam o natural em instrumentos. Mas, para além da eficácia da técnica, há algo mais essencial, as palavras que fixam os seres, que lhes dão vida e sentido.
Há um lado, digamos, "interesseiro", raso, calculista. E há o lado essencial, o de nós, seres humanos que habitamos a casa de tudo o quanto existe, a casa do ser, como diz Heidegger. Qual é a casa do ser? A linguagem. Não linguagem no sentido lógico ou gramatical, e sim linguagem tanto no sentido cotidiano e habitual, como no sentido absoluto que é quando o dizer se torna poesia. A poesia é vasta, mágica, transforma o que não está ainda aí, traz à presença certa plenitude, um vigor.
O dizer poético não é aquele que chama atenção facilmente, literalmente, não atrai à primeira vista, nem é um vislumbre estético passageiro.
O dizer poético é uma experiência, uma harmonia que a força da palavra traduz, uma novidade, um caminho conduzido pela linguagem, uma vereda, um modo de ver, uma rara abertura para o ser.
Encontrar a palavra disponível para apresentar o ser, é a isso que o poeta nos convida.
A canção popular, por vezes, atinge esse dizer mágico, traduz aquela abertura:
"É tão difícil olhar o mundo e ver
O que ainda existe
Pois sem você meu mundo é diferente
Minha alegria é triste"
(Erasmo e Roberto Carlos)
Como pode alegria ser triste?! Esse oxímoro ou paradoxo assume um novo sentido, não é paradoxal que a antiga alegria se tenha transformado em tristeza, e que atualmente seja uma triste alegria. Sob o olhar do poeta."Deixe-me ir, preciso andar, vou por aí a procurar; rir pra não chorar ...
Quero assistir ao sol nascer; ver as águas dos rios correr; ouvir os pássaros cantar; eu quero nascer; quero viver.
Cartola e tantos outros compositores traduzem, criam e transformam vivências e percepções: "eu quero nascer"...
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