sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Questões fundamentais da Filosofia

 A Filosofia nasceu ocidental, ou mais exatamente, helenística. Diferentemente do mito e das religiões e cultos, nela predomina o exercício da razão, do argumento, da reflexão, da busca por fundamentos do cosmo, da vida, da sociedade, do ser mesmo enquanto tal.

Fundamental é que o pensamento filosófico se difunde e se fixa por meio da escrita. Todos os filósofos liam, escreviam, muitos foram mestres. Os ensinamentos por vezes eram anotações de seus discípulos, caso mais evidente o de Platão.

Há assim a transmissão do saber, e seu permanente acesso no acervo da história.

Um dos fundamentos da Filosofia é essa conservação, quer dizer, o que certo filósofo ou certa escola escreveram e transmitiram, não morre. Os filósofos e suas lições podem ser reescritas, elucidadas, explicadas e levadas adiante. O que não pode acontecer com a Filosofia é o descarte, a superação motivada por falha ou erro, ou por novas descobertas, como é o caso da ciência.

Esse é um princípio filosófico, a possibilidade de aprender e usufruir de cada filósofo e de cada escola de pensamento, seja ele Aristóteles, a filosofia cristã, um estoicista, um racionalista, Kant, Hegel, Nietzsche...

Essa riqueza e diversidade ensina que a História da Filosofia precisa ser levada em conta como princípio fundamental da própria Filosofia, principalmente se pensarmos em seu ensino.

Uma base sólida e necessária é a possibilidade de questionar e aprofundar reflexões, levar adiante os ensinamentos filosóficos e com essa base talvez começar a pensar por si, alargar os horizontes do saber, explorar as nuances e o sentido dos conceitos e ideias.

Desse modo se constrói o edifício do saber, e ao mesmo tempo se evita o inverso desses princípios fundamentais, ou seja, a estagnação doutrinária, exatamente o inverso e a morte da filosofia. O apego a um filósofo como se ele fosse a resposta única e final, como se ele fosse o mestre absoluto, o "dono da verdade", como se costuma dizer é morte da filosofia.

Isso não significa que não devamos aprofundar a leitura e a reflexão que certo filósofo ou corrente filosófica ensejam. Pelo contrário, todo filósofo digno do nome possibilita essa condição de ir adiante, dar novos passos. A preocupação em defender obstinadamente o "seu" filósofo é esclerosadora...

O verdadeiro obstáculo são as dificuldades de compreensão, o pensamento filosófico é sempre profundo, os conceitos e ideias são em geral abstratos demais para uma primeira e mesmo segunda leitura. Mas faz parte, é um princípio filosófico o aprofundar, o levar adiante até onde o pensamento alcança.

O voo, o lançar-se, o mergulho, o olhar em perspectiva são as dádivas do saber filosófico.

Imortalidade e mortalidade se cruzam como princípio fundamental na Filosofia. Isso dá a pensar, isso é filosofar...


quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Qual o sentido da vida?

 Impossível uma resposta única, essa é uma questão absolutamente pessoal, ou, pelo menos, deveria ser.

Como a maioria delega a resposta e a responsabilidade a um credo, a um líder, a alguém próximo ou superior, a uma seita, a um partido, ao acaso, ao além, ao divino - , em todas essas situações há uma resposta pronta e satisfatória.

Mas viver para um ideal não é o mesmo que viver segundo um credo ou partido. Isso porque credos e partidos comprometem de modo
cego e irrestrito, assim, o ideal deixa de ser pessoal. Por sua vez, se a pessoa é um criador de valores, se suas tarefas e objetivos os mais banais e cotidianos são permeados de um significado pleno, atento a si, aos outros, seus familiares, aos que se foram, aos que dependem de você, de sua dedicação, afeto e compreensão, então essa abertura para o outro, essa visão do todo, esse estar no mundo, o compartilhamento de sentimentos, e porque não de amor, enraíza, dá frutos, enriquece, enfim, faz sentido, dá sentido à vida.

E, de onde surge essa valorização da vida?

Do aprendizado, do simples olhar ao seu redor, da fé que não cega e sim daquela fé capaz de acender uma luz interior, e chegar àquilo que os estoicos almejavam, a tranquilidade da alma.

Alma? Sim, não aquela predestinada a gozar o céu ou a penar no inferno, e sim a alma cultivada como se cultiva um jardim, com cuidado, com constância, com a capacidade de esperar que o grão germine, que se possa colher as flores e admirá-las.

Somos grãos de poeira no universo. Somos igualmente responsáveis pela brutalidade que explode cidades e as transforma em grãos de poeira.

Onde então o sentido no rosto sofrido de uma criança refugiada? A questão do injustificável sofrimento, do mal, da dor? A inescapável dupla face da vida,  ruína e reconstrução, egolatria e desprendimento, ignorância e sabedoria, queda e ressurgimento. Essas oscilações nos mantêm por tênues fios, por busca e por decepções, essa nossa marcha requer cuidado, esforço como se fossem sopros, os sopros vitais.

As viagens, os viajantes - tantas espécies deles!

Tanta nacionalidade sobre o mundo! tanta profissão! tanta gente!

Tanto destino diverso que se pode dar à vida,

À vida, afinal, no fundo sempre, sempre a mesma!

Tantas caras curiosas! Todas as caras são curiosas

(...)

Tão complicadamente simples, tão metafisicamente tristes!

A vida flutuante, diversa, acaba por nos educar no humano.

Pobre gente! pobre gente toda a gente!

(Fernando Pessoa)