sábado, 26 de agosto de 2017

Eternidade ou temporalidade?

Em conversa na fila do super mercado sobre idade e velhice, um senhor disse não ter pressa, pois o aguarda a eternidade, seja no céu seja no inferno.
Como seria uma eternidade no céu dos cristãos católicos? Bem aventurança, anjos, paz celestial, sem nenhuma mudança, uma vez que eternidade pressupõe a repetição do mesmo, para sempre. Um tanto aborrecido esse celestial...
E o inferno? A eterna danação, arder sem queimar, se queimar acaba o castigo que é para o todo e sempre. Infernal demais...
Enfim, eternidade não parece favorável nem para premiar as boas almas (e o que são boas almas?) e nem para punir as más (idem).
E que dizer do paraíso muçulmano? Baús repletos de jóias, só para homens que desfrutariam para sempre de lindas donzelas ...

A imaginação, o sentimento trágico, o inconformismo com o fim da vida levam a pintar cenários onde seríamos todos imortais, mas imortalidade implica em ser, desejar, permanecer, sentir?
Claro que não, teria que haver total e completa imobilidade, um escoar sem fim, sem tempo, sem antes, durante, depois. 
Nós, humanos, que tecemos essas tramas para nelas deitarmos eternamente, somos fruto do tempo. Nossa existência humana é antes de tudo temporal. Na e pela temporalidade construímos nosso mundo, nossa cultura, nossa arte, nossas técnicas. O fazer e o pensar estão imersos no escoar do tempo. 
Não podemos sair dessa condição, porque inclusive para sair há um antes da decisão e um depois da decisão, isto é, tempo.

Pois bem, é em nome do paraíso profético dos fanáticos do Estado Islâmico que jovens se imolam para matar o maior número possível de "infiéis". Infiéis são todos que desobedecem aos preceitos corânicos, por eles mesmos interpretados, em oposição à fé pacifista da religião.
A liberdade de credo e crença é o maior mérito da cultura ocidental, junto com a tolerância e o respeito à dignidade.
Evidentemente para implantar o Estado Islâmico liberdade é impensável. Fanatizar e espalhar medo e terror são suas armas.

A reflexão, que poderia levar ao respeito mútuo inexiste; a reflexão sobre a condição humana, a de ser no tempo, necessariamente, inexiste. 

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Contingência e necessidade

Há algo absolutamente necessário, condição sine qua non para nossa existência?
Sim, nascer, viver/sobreviver e inevitavelmente morrer. Nós e outras criaturas. Outras criaturas, seres que habitam nosso planeta, necessariamente, com certeza.
Tudo mais, são condições adventícias, contingentes, que podem ou não ocorrer.
A pergunta pelo limite do que sabemos, vale também para a dúvida sobre o que não sabemos.
Não sabemos, mas gostaríamos muito de saber, se estamos sós, se nosso planeta, esse grão de poeira no infinito do espaço, é nele, e só nele que surgiu essa capacidade de indagar, de inventar, de usar recursos para sobreviver.
Impossível com nossos signos, linguagem, modos de comunicar, imaginar, transmitir dados, aceder ao Outro, ao além de nosso mundo. Não podemos saber se estamos sós, se acompanhados por outro tipo de inteligência, ou se é nossa capacidade de imaginar, de sonhar, de prever, de justificar a solidão cósmica que nos impulsionam a pleitear outras formas de vida.
Se aceitarmos a hipótese filosófica de que tudo é contingente, de que tudo poderia ser ou não ser, e dessa forma ou de outra, poderíamos abrir novos caminhos. Se, pelo contrário, dermos tudo como necessário, credos, religiões, ideologias, violência, preconceitos farão parte da existência, e, nesse caso, existências presas a essas crenças. 
Vai-se o espírito livre, e, absurdo, nossa história passa a ser imposta. Vai-se a concórdia, instala-se a discórdia. Espíritos livres aderem à contingência, buscam a paz e dizem não ao conformismo; mas aceitam as exigências existenciais que levam a suportar o mundo real. 
Assim, sem pretender transformar o mundo real em mundo fictício, aquele inventado por nós e posto por nós a serviço do poder de uns poucos dominadores, exerceríamos nossa liberdade. Rejeitaríamos as imposições de partidos políticos doutrinadores, ideologias ditatoriais de igualitarismo, fanáticos religiosos. Então e só então prevaleceria a liberdade.
Liberdade tem a ver com contingência, com experimentação, com inovação, com dizer não às tiranias e imposições que produzem animais fracos e gregários, como criticou Nietzsche.
Ao exercer a liberdade e admitir nossa contingência, que tudo pode ser diferente e transformado para melhorarmos nossa condição existencial, poderíamos aplicar a máxima de que somos obras eternamente inacabadas.