domingo, 29 de setembro de 2019

O que é "significado" para Dewey?

No pensamento de Dewey (1859-1952) há uma convergência entre real e ideal, o que mostra ser o pragmatismo uma alternativa entre duas correntes que sempre se opuseram ao longo da História da Filosofia.
Para o idealismo platônico valem as ideias, como protótipos de todos os seres existentes. Para o realismo aristotélico valem as substâncias, quer dizer, os entes com sua essência e suas determinações.
Essas duas correntes influenciaram diversos filósofos, até que Kant mostrou ser impossível atingir a essência mesma sem que sínteses fossem feitas pelo nosso entendimento.
Mas Dewey propõe algo diferente de Kant, não a solução por sínteses a priori que requerem sempre formas puras do entendimento como tempo e espaço para situar o cognoscível, e sim uma aproximação entre o ideal e o real.
Os modelos ideais de Platão se concretizam nos projetos humanos que transformam a natureza, a sociedade e os nós próprios.
O real descolado de nossas ações não faz sentido algum. Assim, o que nos cerca tem um uso, passa por nossas determinações, pela ação inteligente, pelas experimentações. O filtro da realidade não são anteparos conceituais e formais, absolutos e imutáveis e sim a comunicação. A necessidade humana de comunicar faz com que as coisas saiam de seu estado externo que produz estímulos, para situações que requerem respostas, pois são revestidas pelas necessidades e usos. Os acontecimentos se tornam significativos, se tornam meios para a ação. 
Não somos dotados de uma mente ao estilo cartesiano, de um cogito, como se o pensamento fosse uma energia espiritual e não algo ligado à realidade experimentada. Pensamentos são experimentações que combinam representações com significado. Para tal se usam signos em sentenças que se articulam por meio de recursos lógicos, como consequências, implicações, coordenações e todos esses recursos funcionam como instruções para a ação.
Pensamento é uso inteligente da experiência, impossível sem a linguagem, e esta impossível sem o aprendizado, sem a interação humana.
É em eventos, em situações e em contextos que objetos e coisas se tornam significantes. A linguagem não somente permite a comunicação e a interação humanas, ela vai além, a linguagem acresce a nossa interação com significados que enriquecem a ação.
O simples observar dos movimentos de um pássaro é sempre acrescido de algum sentido, estético, científico, pedagógico, simples fruição, etc. Tudo o que fazemos corriqueiramente com coisas e situações, são como mensagens que usufruímos e transmitimos, as coisas são "lidas" e não simplesmente percebidas como querem os realistas.
"A linguagem é uma forma de ação", diz Dewey. Sem ela viveríamos colados no mundo das coisas, somente afetados por elas. Com a linguagem julgamos, apreciamos, interpretamos, participamos, conservamos, enfim, nos tornamos seres comunicantes, agimos, experimentamos, transformamos a vida em algo compensador, em "uma sociedade digna de afeição, admiração e lealdade" (Dewey).

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Nietzsche: "Todos os filósofos até agora amaram suas verdades"

Que pensamento incrível e certeiro esse de Nietzsche!
E o que ele quis dizer?
Em toda a história da Filosofia, até ele Nietzsche, houve essa marca de vaidade e de considerar-se como único, verdadeiro e insubstituível pensador. Ora, como é possível que cada qual se considere mensageiro da verdade e os outros não? Seriam portadores de mentiras?!
Um olhar para o desfilar dos filósofos mostra que, por um lado, se o pensador não praticasse com seriedade sua doutrina e se não estivesse convencido de contribuir com um pensamento original, teria que calar-se. Por outro lado, se estivesse convencido de que só ele teria razão, deveríamos abandonar a história do pensamento filosófico Ocidental.
Como sair desse dilema? 
E mais, o próprio Nietzsche seria uma alternativa para fazer a crítica e não cair na própria armadilha? É o que se chama em filosofia de "aporia", impossível afirmar algo sem destruir ao mesmo tempo o argumento.
O filósofo opina ou diz a verdade?!
Opiniões podem ser aceitas ou rebatidas, já a verdade seria única.
Não é bem assim. Opiniões não criam amarras, não comprometem, e a  verdade compromete?
Acho que é por aí, há um compromisso com os argumentos, raciocínios, ideias, conceitos, noções e demais meios de que os filósofos dispõem para apresentar suas contribuições à crítica do pensamento.
Sempre que se tratar de criticar, de expor sem contradições os argumentos, o filósofo faz uso legítimo de suas ideias e conceitos.
Se ele tergiversa, se bloqueia o raciocínio, se cai em contradição e aporias, a missão filosófica perde sentido.
Esse é outro desses conceitos filosóficos que são essenciais, fazer sentido.
Faz sentido a afirmação de Nietzsche de que todos os filósofos são até ele vaidosos, que todos se pretendem verdadeiros. É isso que ele quer dizer, faça filosofia, isto é, seja um filósofo comprometido com a história, amar suas verdades leva a ignorar o quão pouco sabemos
E isso não tem a ver com atitudes de humildade ao estilo do rebanho, ao rebaixamento, e sim com atitudes de serenidade, de alegria e satisfação de se saber produtor de ideias, renovador, inovador, aquele que abre caminhos sem exigir aplauso ou submissão.
Os ideólogos exigem adesão cega, seguir o chefe, aceitar (ou seria engolir) a doutrina.
A Filosofia permite respirar, inspirar, e ir adiante.
Fazer as perguntas que ampliem a crítica evita aceitar passivamente os instrutores, os ideólogos, os doutrinadores.
Kant dissera que é mais fácil segui-los, como na brincadeira infantil: "Tudo o que seu mestre mandar, faremos todos!".