domingo, 23 de maio de 2010

Freud explica!?

Não, acho que Freud não explica, na medida em que não há o que explicar sobre o comportamento, os desejos, angústias, temores, valores nossos, dos seres humanos. Toda teoria científica com pretensão de explicar, converter, elucidar e pôr um ponto final em nossas interrogações e conflitos, é falha.
Freud contribui com algumas análises interessantes, como a de que o inconsciente move nossas intenções, que ele é inacessível, que não podemos apreendê-lo. Se conseguíssemos atingir os mecanismos psíquicos do inconsciente, é claro que tais mecanismos passariam a ser conscientes. Então temos apenas pistas do que acontece no mais fundo do nosso psiquismo.
Porém, não foi apenas Freud que supôs que algo desconhecido nos move. Hobbes, no século 17 já falava em forças impossíveis de controlar, como o instinto de conservação. Naturalmente egoísta, o homem luta por mais e mais poder, os fracos sucumbem e os fortes sobrevivem.
O que Freud apresentou como novidade foi a teoria da sexualidade. Somos movidos pela pulsão sexual, a repressão da sexualidade explica, inclusive, haver civilização. O inconsciente é movido pela pulsão sexual , esse impulso é inelutável, está presente em todos nós, da mesma forma e desde sempre, tanto na espécie humana, como em cada indivíduo. Mas o tempo todo ele é reprimido pelo nosso eu e pela sociedade.
Há quem conteste. Wittgenstein não aceitou essas ideias. Freud afirma que sonhos são realizações de nossos desejos. Sonhos, diz Wittgenstein, tanto podem proteger nosso sono, como perturbar, podem tanto preencher um desejo, quanto impedir um desejo. Quantos sonhos são terríveis ou prazerosos! Não há uma teoria dinâmica dos sonhos, a psicanálise não é uma ciência: uma teoria científica precisa ser verdadeira ou falsa. As explicações de Freud para as doenças mentais, para a loucura, em nada ajudaram. Pelo contrário. A busca da causa do sofrimento psíquico na vida sexual da criança, além de não se justificar (todas as crianças teriam um mesmo complexo, todas odiariam ou amariam seu pai ou sua mãe - mas isso é estranho, não?), nada explica sobre doença mental, o sofrimento psicológico. Além disso, diz Wittgenstein, qualquer idiota apela para essas pseudo-explicações, e eu acrescentaria, com o ar de quem entende, decifra e aposta que anos no divã podem reconciliar a pessoa com seus problemas!
Foucault também critica Freud, não por afirmar que desejos nunca são supridos, nem pela teoria do inconsciente, mas pela teoria da repressão sexual. Para Foucault a sexualidade é um dispositivo histórico, cultural e não biológico, instintivo. Foi inventado! Experimente dizer a um budista ou a um muçulmano ou a um cristão que sua vida se reduz à pulsão sexual. Não faz sentido para nenhum deles, e todos vivem muito bem, obrigado. Ou não, mas isso não tem nada a ver com a sexualidade.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

O conceito atual de filosofia

Desde os primeiros filósofos até o século 19, portanto, até o início da modernidade, a filosofia tinha uma missão de ordenar e de fundamentar todos os conhecimentos. Aristóteles a considerava como a “rainha das ciências”. Para Descartes a metafísica era a raiz do saber. Para Kant a razão era suprema. Desse modo a filosofia poderia ser a base para ciência, a moral, o direito.
Atualmente, a maioria dos filósofos considera que ela colabora com todos os saberes. Não há mais uma concepção dogmática e impositiva: se os conceitos nascem de uma cultura e de uma história, a tarefa filosófica é a de pensar a diversidade das culturas em colaboração com a arte, a moral, o direito, as ciências.
Nossa época, a época da modernidade possui estruturas de racionalidade próprias, como a informação e a ciência; possui uma ética descentrada (não mais ditada pelas religiões), pluralismo de credos e ideias, um saber científico renovável, autonomia na arte e no direito.
A filosofia pode e deve fazer a mediação entre esses saberes, ensejar o diálogo entre eles sem pretender totalizá-los em uma única grande teoria que pudesse explicar o real de modo certo e indubitável.
Essa nova perspectiva leva a filosofia a fazer uma leitura de nossa época e propor caminhos alternativos para que se possa pensar com autonomia, liberdade, ampliando e renovando as experiências com o mundo. É um importante instrumento para pensar nossos problemas e dificuldades. Quando se questiona como e por que tal ou tal saber foi produzido, tal ou tal conceito é usado, o pensamento como que se ilumina, surgem novas ideias, mais criativas.
Ainda assim, há culturas e sociedades até hoje fechadas, impermeáveis, sectárias. Pense no Irã, no fundamentalismo islâmico, ou nos ditadores de alguns países africanos e de alguns vizinhos nossos, risíveis e farsescos, nem por isso menos perigosos.
Enfim, a filosofia pode mudar o modo de ser e de pensar de uma pessoa, e, às vezes, de toda uma cultura.
"Eu discordo de que haja um conceito ideal de exatidão dado a priori, como tal. Em épocas diferentes nós temos diferentes ideais de exatidão; e nenhum deles é supremo". (Wittgenstein)