quarta-feira, 28 de julho de 2021

Razão e Religião, como Kant as vê

 Para Kant, a razão ensina que há coisas que não podemos conhecer, como a vida após a morte. Em escrito anterior às "críticas", Sonhos de um visionário, Kant argumenta que crer em espíritos e em outro mundo é inútil, posto que sendo imateriais não há como chegar a eles. 

Quanto à moral, ela faz parte das ações livres, das práticas, da liberdade e da autonomia do sujeito. Não pertencem ao domínio divino, se assim o fosse perderíamos a autonomia.

Ao passo que as religiões se guiam pela fé. Lembremos que Kant fora educado em ambiente estritamente religioso, e o sentimento religioso vale pela sinceridade do coração, faz parte das convicções pessoais. As leis morais são projetadas para fora do sujeito e se tornam fé religiosa. Mas Kant discordava do apego aos rituais, discordava do fanatismo, da adoração, das superstições. As religiões deveriam basear-se em princípios, entre eles aquele que Kant tanto prezou, o do dever. O dever moral e a boa conduta importam mais na relação religiosa com Deus do que os rituais. Kant defende a liberdade para a prática de religiões, condena a submissão às autoridades eclesiais, e, principalmente, a hipocrisia. 

Infelizmente há religiões, ou melhor, seitas, em que se vê o "Façam o que eu autoridade e chefe comando", mas em particular vale tudo, inclusive auferir proveitos, submeter os fiéis às suas ameaças, prometer céus e exigir em troca, para usar um termo antigo, moedas.

São hipócritas os que pregam a fé sem base em convicções. Assim se a crença em Deus depende de delegar a ele a função de legislador das leis morais, a própria pessoa se vê desobrigada da responsabilidade pelos seus atos. Para Kant apenas cada um de nós é responsável pelas suas ações, é a  nossa consciência que aponta o caminho do bem.

A ação pode e deve ser aperfeiçoada, há valor em ter esperança na realização do reino de Deus  na Terra, entre os homens. Esse aperfeiçoamento ético decore de obediência à leis morais sem coerção. Trata-se de uma concepção de religião de pura fé moral, as prescrições doutrinárias são secundárias. Orações e sacrifícios são ilusórios, frutos de superstição (in 15 Filósofos, vida e obra, p.211).

A razão prática abriga a fé como uma de suas facetas e não o contrário.

quinta-feira, 22 de julho de 2021

O que é alienação?

 "Alienados", assim eram chamados os doentes mentais, os que eram internados nos asilos e hospícios. Um conceito que ficou para trás.

Por alienação se entende a falta de consciência, a má consciência, o apego a certas ideologias, crenças, a adesão sem crítica a uma doutrina política, social, ao moralismo apegado a preconceitos, enfim, veste-se o véu da ilusão.

Adotar uma postura política, partidária, fé ou crença em doutrinas, quando a pessoa ou grupo são abertos para outras posturas, partidos ou crenças, a possibilidade de alienação amortece. Quando o lado oposto é ouvido, quando o grupo ou a pessoa aceita entender o contraditório, então surge a possibilidade de argumentar, de ouvir o outro, de esclarecer as ideias, de expor seus compromissos e seu modo de pensar e agir.

Quando se é ou se está alienado, ao contrário, a cabeça e as ideias ficam fechadas num mesmo círculo, isso mesmo, o alienado anda em círculos, e o pior é que tais limites foram estabelecidos por ele mesmo, ou por seu partido, grupo com seus hábitos, sua cartilha, seus mandamentos. Basta baixar a cabeça e seguir o rebanho, sem pensar, cego para as alternativas, fechado para dar e ouvir razões. 

É fácil seguir o chefe, e os seguidores alienados formam bandos que seguem palavras de ordem engolidas e expelidas. 

Ora, torcer para um time e a ele se apegar, não é alienação, é só paixão. E onde está a diferença?

Quando se torce por um time ou para se ganhar em qualquer tipo de atividade esportiva, o que está em jogo é justamente isso, um jogo. Nos jogos se ganha ou se perde, se conquista ou se é derrotado.

Não é o caso da alienação, o nível em que a má consciência se dá é outro, é o da obstinação, da certeza absoluta sem base alguma nas situações, na vida social e política, nas lições da história. Não há na alienação nem forma e nem conteúdo, trata-se de uma massa disforme e distorcida que serve para justificar a falsidade, o engano, a mentira ou em nossos dias, responsável pelas fake news. Para defender um lado vale tudo, e ambos os lados alienados se autoproclamam como certos, e os outros como errados.

A alienação é prejudicial, o rebanho é aliciado para defender o chefe. 

E essa situação de dois lados, ambos com a verdade e a razão, são no final das contas poderosas amarras que mantêm o círculo vicioso.

Em nosso país sofremos com esses dois lados políticos, que alienam e são as duas faces da mesma moeda.

Moeda falsa e gasta.