domingo, 28 de junho de 2020

"Serotonina" de Michel Houellebecq

O proclamado como um dos melhores escritores e poetas da França na atualidade em "Serotonina" reafirma conceitos e ideias de sempre, insiste em ser o novo "enfant terrible" da literatura talvez mundial.

Há trechos no início que beiram a pornografia, o personagem não se dá bem com ao menos três mulheres, uma delas o serve como se fosse concubina (uma japonesa), o amor por uma moça linda e bem mais jovem que ele, é uma paixão doce e forte mas apesar de amá-la acaba por trai-la e o relacionamento acaba. Um terceiro amor também é frustrado.
O personagem é empregado da Monsanto, o que dá à narrativa aquele tom caro ao autor de politicamente incorreto, e mencionar poetas malditos, expressar seu desprezo por eles vai na mesma direção.
Basicamente o personagem que passou dos 40 é depressivo e o medicamento o deixa impotente. Resta a solidão auto-infligida, o cigarro, a visita a um amigo no interior da Normandia que revela a condição difícil do agricultor diante da abertura ao comércio da União Europeia.
Enfim, o autor aborda temas contemporâneos, até mesmo pornografia infantil, a possibilidade de comprar armas, algumas situações é um binóculo super potente que revela, o tudo isso me parece forçado, artificial, como se Houellebecq passasse em revista temas polêmicos e os inserisse na narrativa.
Quando em extrema solidão após ter se desvencilhado da amante japonesa e de todos os demais laços com sua vida, vai morar em um hotel (é preciso que o hotel aceite fumantes, algo bem raro e alvo de mais uma de suas críticas) do qual mal sai, apenas para comer. Munido de antidepressivos, passa a ler "A Montanha Mágica" de T. Mann e Marcel Proust. Logo se aborrece com ambos, acha que o longo romance do autor alemão apenas repete, nada acrescenta a "Morte em Veneza", e considera Proust pelo ângulo da sexualidade.
Evitar a unanimidade e o lugar comum parece ser uma das intenções não só do personagem mas do próprio autor. Chama a atenção, provoca polêmica, induz às críticas e ao debate. 
Evidente que isso atrai leitores mais "descolados" como se diz e igualmente certa rejeição...
O ponto alto da obra é retratar o sofrimento dos depressivos, a tendência suicida, a terrível e irremediável paixão frustrada. Continuar com os antidepressivos e permanecer impotente, ou matar-se?
A redenção e a razão pela qual o autor que se qualifica para pertencer aos melhores fica por conta das páginas finais, reflexivas, profundas e poéticas.
Vale ler? Sim.

quinta-feira, 18 de junho de 2020

O filósofo enquanto educador

Impossível separar filosofia de educação e educação de filosofia. 
Não é necessário aprender os conceitos filosóficos mais elaborados, importa isso sim, o modo como aprofundamos as questões, como abordamos os problemas, como vamos às raízes das dificuldades e, ao mesmo tempo, sabemos o que esperar no processo educacional.
As perguntas: o que é mais importante, com quem lidamos, quais são os objetivos, o que significa aprender, como alcançar patamares de qualidade e superar dificuldades? Em todas essa abordagens o educador trabalha com princípios e metas, com valores e resultados, com conteúdos e com avaliações, com processos de formação/qualificação e com integração social.
As escolas, os professores, os formadores e os alunos são vidas, são pessoas, são entes sociais que se qualificam para todo o conjunto das atividades de uma sociedade.
Qualidade de currículo é incompatível com treinamento cego, com ideologização, com doutrinação, com militância. 
No dia de hoje, 18 de junho, o governo decide finalmente substituir o Ministro da Educação (enquanto escrevo ainda não ocorreu...) infelizmente não pelas razões mais profundas, isto é, de princípios, justamente de acordo com a relação que deveria haver entre filosofia e educação.
Quero me referir à proclamação feita por Weintraub na reunião de 22 de abril, a de que ele é um militante. Aprendeu com Olavo de Carvalho que precisava introduzir um novo mote, o da escola sem partido. Ora, não só não atingiu o objetivo de peneirar o ensino da ideologia igualmente deletéria dos marxistas que se instalaram nas faculdades de educação, como falhou em inúmeros aspectos.
O que faltou?
Equilíbrio, reflexão, pensar na finalidade do processo educacional, seguir metas de aperfeiçoamento, melhorar a qualidade dos conteúdos e currículos, adotar perspectivas inovadoras, conseguir que os mestres e dirigentes se voltassem para o aluno, sua formação, sua inserção social, derrotar o analfabetismo, melhorar a qualidade do ensino.
Enfim, é um erro acreditar que um lado do perfil de esquerda precisa ser urgentemente confrontado e por quais razões, impor outro perfil de direita.
Ser liberal não é ser escravo do mercado de trabalho como pensam os marxistas. O liberal acolhe abertamente sugestões, esclarece no bom sentido iluminista, até mesmo kantiano, não sufoca, não impõe e trabalha por resultados, melhoria do ensino que no Brasil, ainda mais com escolas fechadas, só piora.
Equilíbrio, olhar o todo, aprofundar, examinar as questões pelos seus diversos ângulos, propor sugestões. Por que isso não é uma prática, em especial no ensino público?!