quinta-feira, 23 de novembro de 2023

A publicação de periódicos de ciências humanas e a moda intelectual

 Recentemente a revista "Percursos", da UDESC, que recebe contribuições na área de ciências humanas e de ciências sociais aplicadas, anunciou o seguinte tema para o seu dossiê:

"Perspectivas contracoloniais e ecologias antirracistas em tempos de catástrofes planetárias".

Essa chamada para o dossiê chamou minha atenção pelo título, do que se trata, é político, ecológico, denúncia de violência racial, é sobre aquecimento global? Enfim, provoca certa perplexidade e dúvida: qual é o rumo que toma o pensamento atual em ciências humanas e, por extensão a reflexão filosófica?

O termo "perspectivas" sugere que podem ser diversas e diferentes visões, pode-se seguir um caminho, mas outro caminho não seria problema.

O termo "contracoloniais" significa ser ou ir contra colônias, seriam as antigas colônias na África, Ásia, América do Sul? Ou seria um tipo de colonização do pensamento, um empecilho ao livre pensar?

Mas, em seguida aparece o termo ou conceito por demais sabido e esclarecido, "ecologias", o estranho é o plural, ecologias, que aparentemente não tem nada a ver com a ecologia da ou na natureza, como atenção ao meio ambiente, cuidado com o planeta, poluição, importância das florestas, a preservação da Amazônia, enfim, o que hoje em dia se entende quando se fala em ecologia. Seriam ecologias antirracistas...

Quando se menciona "raça", no caso acima "antirracistas" o peso e o significado social, econômico e histórico acende, ou melhor, incendeia o debate, as controvérsias e a atual situação de povos e etnias que sofrem ou sofreram preconceito, violência e discriminação, tudo isso é por demais evidente. 

O que intriga é relacionar colonialismo, proteção e cuidado com a natureza, ou seja, ecologias, com raça.

Seria um retorno às origens, penso no caso dos descendentes de africanos no Brasil, apontar caminhos para sua integração, para um antirracismo?

(Mencionar raça no atual momento da guerra Israel/Palestina faria sentido se "antirracismo" se referisse a uma política favorável aos judeus. Não é o caso porque na guerra ideológica eles são considerados povo "opressor").

A cada termo desse chamamento para o dossiê, a análise e a compreensão ficam mais complicadas.

E se mencionarmos raça ao lembrar da terrível perseguição, morte, castigos, enforcamento dos negros nos EUA até recentemente pela KKK? Seria essa denúncia um movimento antirracista?

Entretanto, fica ainda mais difícil seguir uma dessas vias teóricas, pois o título indica que se deve situá-las no tempo, que tempo é esse? O das "catástrofes planetárias". Quer dizer, derretimento da calota polar, secas, inundações, calor extremo, enfim, todas essas catástrofes seriam o pano de fundo histórico, social e econômico desses conceitos "contracoloniais", das "ecologias antirracistas"?!

A exigência de publicação de parte da academia paga seu preço, seja pela "obrigação" de seguir temas e conceitos da moda intelectual, pela irrelevância ou até mesmo pelo tempo gasto.

***

Escrever artigos para revistas acadêmicas é atividade séria de pesquisa, presume-se sua contribuição para um melhor entendimento e talvez perspectivas (sim) para esclarecer ideias, propostas, abrir caminhos, por meio de estudos com base na sociedade atual, detectar problemas, sua origem e possível solução.

Isso é possível, desejável e produtivo. 


 

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