sábado, 31 de outubro de 2020

"Livre Pensar é só Pensar" (Millôr Fernandes)

O título acima é o dos artigos semanais que Millôr Fernandes publicou até sua morte (2012). Por que razão dele me recordei?

Foram os últimos fatos da violência dos radicais islâmicos na França.

Por que livre pensar é só pensar?

Não acho que Millôr quisesse dizer com isso que o pensamento voa à toa, que basta dar asas ao pensamento, assim sem mais nem menos. "Só pensar" a meu ver significa usar o pensamento, o raciocínio, a razão, pesar as consequências, ser responsável, em suma, é preciso pensar, pensar duas vezes como se costuma dizer.


Antes de soltar a bobagem, o insulto, antes de publicar lixo nas redes sociais, antes de ofender, antes de prejudicar com suas palavras a autonomia e a liberdade dos outros, colocar-se no lugar do próximo e tentar entender a situação em seu todo, em seu contexto, e, principalmente o que a frase, a publicação, a foto implicam. Como afirmei acima, as consequências.

Não é livre pensar provocar, insuflar, incitar, cutucar a onça com vara curta. A onça morde...

Ao assumir que o profeta islâmico é risível, que a crença é totalitária e que não admite controvérsia, ao sustentar que a publicação da charge é satírica, antes de considerar a tal charge como liberdade de pensamento, tanto o jornal como o professor, deveriam pensar e muito, nas consequências.

Liberdade de expressão é igualmente responsabilidade de expressar ideias e conceitos. É perfeitamente possível expor seu pensamento e suas ideais e explicar o que e por que se diz. Qual a fonte? Qual a intenção? Qual o contexto? E isso sem ofender, sem incitar, sem provocar o outro lado...

O outro lado, o dos radicais doutrinados para a resposta violenta e descabida é muito pior, inclui matar, incendiar, destruir e isso em um país exemplo de democracia e sim, de liberdade de opinião!

Os radicais islâmicos são instruídos a eliminar a voz do diferente, não suportam a crítica, como se suas crenças fossem únicas e todos devessem se curvar diante do seu deus/profeta, sem respeito algum pelo outro, pelas outras crenças. E isso devido ao fechamento doutrinal, nada de liberdade para pensar, para se situar em outra cultura, em outros países. Nada de respeito a outras tradições. 

Por quais razões e premidos por quais circunstâncias, saíram de seus países de origem?!

Não teria sido em busca de uma vida melhor? Educação de qualidade, liberdade de opinião, possibilidades de usufruir de bens e serviços? Se isso não serve, se os empregos são subalternos e mal remunerados (o que de fato ocorre), por que não retornar ao mundo e à cultura de origem?

Pensar livre é responsabilizar-se pelas consequências, o que requer educação, ampla visão, conhecimento, inteligência e coragem.

Um comentário:

  1. Eu lembro bem desta coluna do Millôr. A lia de forma costumeira, se não me engano na revista Veja. Considerando a época em que ele adotou este título eu acrescentaria, sem desconsiderar uma só palavra do texto acima: O livre pensar é SÓ pensar pois, fosse exposto, poderia render muitos dissabores a um pensador tão explícito que ousasse tornar público seu pensamento...

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