Foi assim que ele ficou sabendo que minha profissão era professora, e de Filosofia. "Mas que é isso vovó?"
Iniciei minha carreira de professora aos dezenove anos, meus alunos cursavam o antigo Clássico, no Colégio Estadual do Paraná, onde eu estudara.
O colegial se dividia entre opções para CL (Línguas), CB (Biologia), CM (Matemática), e o curso em que eu me formara, CS (Ciências Sociais). Logo me apaixonei por Filosofia, e me tornei professora mesmo antes de me formar na UFPR no saudoso Curso de Filosofia (1968-1971). O melhor professor, que usava anotações pessoais e as expunha com clareza e sabedoria, foi Frei Raimundo Vier.
Assim, mirando-me nos professores, nos filósofos, nas suas ideias e conceitos, não parei de estudar o pensamento das grandes mentes iluminadas que nos inspiram desde os pré-socráticos até os atuais, Dewey, Rorty, Wittgenstein, Heidegger, Sartre, Foucault, Habermas e muitos outros.
Evidentemente, não poderia lançar mão deles para tentar explicar ao meu neto o que seria Filosofia...
Nada melhor do que ilustrar com exemplos e situações do cotidiano, pois por experiência própria sabia o quanto alunos, mesmo mais velhos, têm enorme dificuldade para abstrair, para sair do mais imediato e sensível, para o mais geral e inteligível.
O que é abstrair? O que é inteligível?
Considere essa situação: engatar uma questão na outra. Quem fez esse seu brinquedo? Onde ele foi feito? Como ele foi feito? Do que ele é feito? Como chegou até você?
Isso só para despertar a curiosidade, e as respostas, não importa, podem ser as mais divertidas e absurdas.
Depois, alargar o círculo das perguntas, onde você mora, onde você nasceu, antes de você nascer como era? Nada? Onde todas as coisas do mundo estão? Lugar, tempo, antes e depois, aqui e agora, levam a sair do sensível e local para ir um pouco adiante.
Por que disso e daquilo, justamente um recurso comum e extraordinário ao qual a maioria das crianças com três a quatro anos recorre. Por que esse menino está chorando? E você responde que não sabe.
"Não saber" e "saber", a crucial importância dessa ferramenta. Sabemos, afinal, o que sobre quais coisas?
Se a criança olha para você e faz cara de quem entendeu ou não entendeu, não tem problema. Ela já despertou para o fazer perguntas, uma espécie de diálogo platônico que exercita a inteligência e a vontade de saber.
Filosofia pode basicamente se resumir nisso: "vontade de saber", que implica: conhecer, indagar, usar conceitos, chegar a conclusões, entre elas a dos limites do que podemos saber. Ao mesmo tempo mostrar o que é inaceitável: coibir, proibir, cercear a liberdade de pensamento.
***
PS.: sobre o projeto do Ensino Médio: Seria muito proveitoso perguntar aos alunos que cursam o Ensino Médio se eles gostariam de poder optar entre disciplinas que contemplariam suas preferências e seu futuro profissional.
Duvido que eles abririam mão dessas escolhas... Aliás, alguém pelo menos leu o projeto de lei?
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