terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Hobbes, Rousseau, Thomas Mann e a pandemia

Em uma longa discussão, Thomas Mann confronta em  Der Zauberberg  (A Montanha Mágica), dois intelectuais que defendem ideias e conceitos opostos. Um dos personagens centrais do romance é o italiano Settembrini, defensor convicto da democracia, do humanismo, da educação, e, principalmente, o pensador defende o progresso, as luzes, a ciência, é um entusiasta crente no avanço da humanidade capaz de beneficiar a todos. 

Em contraste, Naphta é um personagem secundário, que surge lá pela metade do romance, sem nenhuma ilusão quanto a progresso, iluminismo, considera que acaba valendo sempre o lado obscuro, verdadeiro terror. A crença em um horizonte utópico no qual a democracia e o bem geral venceriam, é horrível. Há sangue, luta, tudo acaba em opressão e surgem as ditaduras como solução.

Daí o título desta postagem, Naphta estaria mais para Hobbes, ao passo que Settembrini estaria mais para Rousseau.

Hobbes: a guerra de todos contra todos, o homem lobo do homem, a necessidade de atribuir a um soberano forte todo o poder seria o único modo de a existência humana sobreviver.



Rousseau: os homens eram livres e felizes até a apropriação da terra, das divisões e da desigualdade. O contrato social nos salvaria, formaríamos um corpo único com o governo, a democracia como fruto de voto universal seria a redenção da humanidade.



E o que esses pensadores têm a ver com a pandemia?

Pensemos a pandemia um pouco como Hobbes e Naphta, sangue, o horror, os cadáveres embrulhados e postos em caminhões frigoríficos, a asfixia dos hospitais e os asfixiados nos hospitais, sem remédio.

Então surge a senhora rainha ciência, que passou a ser a responsável pela salvação, a vacina. E laboratórios as criam, começam sua produção e entram os fatores de sempre: quem detém o conhecimento, quem detém o poder de incentivar e financiar a pesquisa de ponta? Alguns poucos países, poucas indústrias farmacêuticas, e a suposta centralização e democratização da distribuição fica por conta da capenga e desacreditada OMS, esta serviria supostamente a todos os países.

Enquanto isso, nós no Brasil, desgovernado pelo presidente irresponsável, estamos a mercê da Índia e da China. Poder, dinheiro, planejamento, investimento se fazem presentes na China, cujo domínio de diversas tecnologias é considerado suspeito até a hora do aperto, quando se precisa delas. 

Se cruzam no atual momento os dois filósofos e os dois personagens de T. Mann: a guerra de todos contra todos, a suspeição e a vitória do mais apto, o terror, a sujeição ao mercado de um lado (Hobbes e Naphta) e de outro lado as regras, os parâmetros, a ciência, a produção, a eficiência, os governos responsáveis e de fato democráticos (Rousseau e Settembrini).

Em meio à confusão e mesmo pânico, Maduro, sim ele, o ditador venezuelano, é um dos que socorre Manaus asfixiada.

Grupo de brasileiros saúda caminhão com oxigênio, presente da Venezuela.


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