segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Sobre a morte, Montaigne

 "A morte não nos afeta, nem mortos e nem vivos: vivos porque existis; morto porque não existis. Além disso, nada morre até que chega a hora, e o tempo que deixais tão pouco vosso, é como aquele que transcorreu antes de vosso nascimento e não nos diz respeito em nada. Ali onde vossa vida acaba, tudo acabou. A utilidade de viver não consiste no espaço, senão no uso da vida, e há quem vive bastante tempo e viveu pouco. O que viveis está em vossa vontade e não no número dos anos" (Michel de Montaigne, Ensaios, século 16).

                                     


         

Alguns parágrafos antes deste ensaio "De como filosofar é aprender a morrer", Montaigne relembra o dito Sócrates perante seus algozes quando trinta tiranos o condenaram, o filósofo observa que os trinta que o condenaram, serão condenados também, pela natureza.

De um jeito ou de outro, todos morreremos, a questão é que esse pensamento fica afastado, longínquo, a morte é quase sempre a alheia. A de nossos próximos e, principalmente a nossa, fica de escanteio. Lembremos que o tempo de todas as coisas transcorre lenta ou rapidamente. Compare a quase eternidade das estrelas, do movimento e do próprio tempo/espaço com a duração de um frágil inseto e a nossa, a vida dos homens, cuja consciência de estar num aqui e num agora fica absorvida no dia a dia pelas nossas tarefas, afazeres, preocupações, deveres, prazeres, cobranças, amores, relacionamentos, enfrentamentos...

E ainda, dispersão no corriqueiro, diversão sem limites, recusa da responsabilidade.

E o contraponto, na vida adulta a dedicação, o empenho e o total cuidado consigo e com os outros, saber-se frágil e dotar-se de atitude de compromisso, de busca por realizações. 

Sair dessa vida, o que pode acontecer a qualquer momento, com a consciência do dever cumprido. É por isso que a morte prematura, especialmente a de crianças e jovens afeta tanto as pessoas. Não tiveram esse tempo de realizações. E, como disse Montaigne, há os que têm esse tempo e não o utilizam. 

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