domingo, 19 de outubro de 2014

Filosofia e política, a antiga e a atual

Se é possível afirmar que com Platão surgiu a filosofia sistemática, então é possível afirmar que a filosofia nasceu já política.
O diálogo A República, tem como tema central o ideal político de justiça, sendo esta o principal e indispensável requisito para que um Estado funcione. Para Platão, a cidade ideal é semelhante à alma. O verdadeiro Estado se constitui de modo perfeito, quando os sábios comandam e têm a ciência do que é próprio às demais classes, que são a classe dos artesãos (comandada pela alma dos apetites) e a dos guerreiros que protegem a cidade (comandada pela alma da coragem e fortaleza). Pela temperança se estabelece a concórdia entre a parte superior e a parte inferior tanto de um indivíduo como de toda a sociedade. A justiça decorre de cada um ocupar sua respectiva função, que é aquela que melhor cabe à natureza de cada um. Se cada um cumpre suas obrigações o Estado é justo e feliz. No livro IV de A República Platão explica que a justiça está em cada um cumprir a sua função, o seu dever, que a justiça garante a cada aquilo que lhe é devido. O sábio governa, o rei filósofo aplica as leis de forma justa, as tarefas são distribuídas conforme a capacidade de cada cidadão. 
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Em uma leitura atual, se condenaria Platão por ele ignorar a igualdade e a liberdade. Mas seria uma condenação inapropriada, pois na Grécia clássica justiça é distribuição de funções de acordo com capacidades diferentes. Um oleiro faz bem tijolos, o arquiteto depende desse material e a construção depende de uma boa planta, de um bom planejamento, de um bom arquiteto, portanto, como Platão exemplifica em Político.
Isso seria considerado desigual porque um ganha menos, outro mais. Para nós as oportunidades devem ser as mesmas. Os homens nascem iguais e a sociedade os acorrenta, diria Rousseau. 

Como sair desse impasse?
Com educação universal, seriamente comprometida com o despertar de habilidades e de funções que aliem a capacidade individual com a demanda social e econômica. 
No Brasil, há uma enorme distância entre um atraso que remete ao passado colonial e uma grande parte educada, participante da vida social, com condições de escolher sua atividade conforme sua capacidade, como queria Platão. 
É possível melhorar as condições dos mais pobres? Sim, se houver uma ótima interação entre governo empenhado com escolas e professores de qualidade, com a produção de bens, com a eficiência econômica, com regras transparentes, liberdade pessoal e justiça social.
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Nesse difícil processo, há um obstáculo a mais, que passa batido: são justamente educadores, filósofos, historiadores, pessoas com alguma influência no setor educacional, em geral, cujas cabeças estão encalacradas com uma ideologia ultrapassada, paradoxalmente, marxista. Por que "paradoxalmente"?
Ideologia, segundo Marx, é um véu de ignorância. Faz ver as coisas de cabeça para baixo. Ora, a ideologia de uma esquerda que vive de palavras de ordem ("fora FMI", "fora FHC", "fora capitalismo", "a culpa é das elites", "fora economia global", "fora agricultura de exportação", etc.) representa o atraso para a educação, se por educação se entende abertura, compromisso com a pesquisa séria e responsável nas universidades, com a formação de profissionais aptos para compreender nossa história e nossa realidade.

Ar renovado, precisamos disso, com urgência.

4 comentários:

  1. Ola, essa passagem de Platão é mesmo clássica, pois apesar de parecer ultrapassada ela guarda muitos detalhes que podemos usar seja em sala de aula seja para analisar a sociedade atual.
    Quanto ideologia Marxista acho que nós professores temos muita culpa no mal uso que se faz e que reflete nos desentendimentos que temos hoje, me lembro que nas aulas de economia que tinha na faculdade os alunos não aceitavam as teorias de microeconomia que o professor dava, só tinham ouvido para Marx não entendendo e que micro economia é a parte mais exata da ciencia economica, portanto não exista para agradar a, b ou c. Ela é o que é.
    Quanto a virada tucana no segundo turno, coisa que escrevi em post anterior, acho que fomos surpreendidos mas a luta não acabou, veja que com tudo o que acontece de errado ainda sim as pessoas continuam reticentes à mudança tão necessária e presas a um modelo administrativo que procura agradar hora a a hora a b hora a c. Aécio Neves na verdade esta vendendo a alma, cedendo cada vez mais, é uma pena, mas vamos ver no que dá. Como falei acho que o povo esta enfeitiçado em não ver a realidade, lembro-me do belo filme de Saramago sobre a cegueira.

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  2. Fico feliz e esperançosa com essas observações e ponderações!

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  3. E eu fico esperançoso que voce mude sua opnião sobre o conflito entre Russia e Ucrania, deixando de lado o uso da ideologia para analisar conflitos entre Estados, até porque na RealPolitik a ideologia não está em primeiro lugar.

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  4. Seria interessante perguntar aos ucranianos, no Paraná há muitos descendentes. Estou muito distante daquela realidade para ir além do que sei pela imprensa.

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