terça-feira, 12 de novembro de 2013

A morte da filosofia (cont.): dogmatismo e ideologização

Dogmatismo deriva de dogma, termo grego que significa o que aparenta, uma opinião ou crença. Para os gregos, em especial para a tradição filosófica que remonta a Platão, a aparência é enganadora. Somente o que está por detrás, o permanente, o essencial é que pode ser concebido como fonte de verdade, ou mesmo como o verdadeiro ser das coisas.
No sentido atual, dogma diz respeito às doutrinas e crenças de uma religião, de uma seita, de uma ideologia, e sempre vem relacionado com um conjunto explícito de regras e normas que devem ser respeitadas e seguidas estritamente, portanto, sem questionamento.
Ora, em que pesem a importância e a necessidade de doutrina e dogmas para as religiões, crenças e seitas, no território filosófico todo e qualquer tipo de dogma é inaceitável, impraticável e incompatível com a filosofia. O filósofo precisa de liberdade de pensamento para refletir, deduzir, expor conceitos, ideias, visões de mundo. 
Mas, a filosofia não busca a verdade?!
Ao considerar a própria questão da verdade surgem diferentes modos de pensar e de conceber a verdade. Isso indica que não há a verdade, justamente reivindicar para si ou para sua corrente filosófica a posse da verdade leva a outro questionamento: se uma escola filosófica ou um filósofo chegou à verdade com seu sistema, ou bem ele é o único verdadeiro (e como ficam os demais?) ou todos são legítimos filósofos e também têm cada qual a sua verdade. Logo, a  verdade é a de cada qual, o que implica negar o conceito mesmo de verdade!
Então, filosofia e verdade são incompatíveis?
Filosofia e verdade como posse, como dogma é que são incompatíveis. O dogmático se vê como o único a chegar ao sistema conceitual verdadeiro e isso é a morte da filosofia.
Realistas, idealistas, céticos, empiristas, analíticos, racionalistas, enfim, cada uma das várias correntes filosóficas investiga, pesquisa, analisa, conceitua e tem sim, concepções diferentes de como a verdade é possível de se atingir, ou mesmo de que não é possível verdade, como os céticos.
Assim, se verdade for considerada a ideia permanente, ou a experiência com dados dos sentidos, ou o que a linguagem estrutura, ou o que o pensamento capacita, isso não significa multiplicar a verdade (o que é absurdo). Isso significa que o trabalho do filósofo é comparável ao cultivo de plantas ou de um jardim, cada espécie vegetal requer um terreno, um tipo de cultivo, uma época de colheita, etc. Um jardim difere de outro, entrar num deles e usufruir de sua sombra ou beleza, não impede apreciar outro(s).
***
A ideologia não tem nada a ver com verdade. Justamente, é um modo de julgar e de avaliar que passa por um conjunto de propostas de ordem social, política, jurídica, que influencia e é influenciado tanto pela sociedade na qual nascem e da qual fazem parte, como pela época histórica da qual são também parte integrante. Abolir ideologias, nas atuais sociedades de Estado, com organização política, partidária, com tipos de governos e poderes legítimos, levaria automaticamente à imposição de uma única ideologia. Exemplos recentes: URSS stalinista, China de Mao, "república" dos aiatolás e, infelizmente, outros mais, houve ou há a imposição da ideologia única.
Ideologizar ocorre quando uma ideologia é importada da sociedade política e penetra com disfarces na filosofia e no seu ensino, nas pseudo narrativas históricas, nas concepções pedagógicas, e sempre que certo modo de ver e de pensar se propõe como salvador, como promissor da redenção de todos os males, da desigualdade social ao fim do lucro e da exploração.
Esse tipo de ideologização penetrou fundo no sistema "educacional" brasileiro há algumas décadas e "fez a cabeça", como se diz, de um sem número de professores, autores de livros didáticos, pedagogos, e de propostas para a educação. 
Ideologização e dogmatismo se dão as mãos no projeto educacional brasileiro, gerações adotam o pensamento único e a verdade universal de que a visão marxista da história como luta de classes é a verdade.
Morre a filosofia e também a educação...

Nenhum comentário:

Postar um comentário