terça-feira, 1 de maio de 2012

Por que é tão difícil compreender Hegel?

O marxismo foi em grande parte responsável pela divulgação da dialética de Hegel como método, como explicação do sentido da história. Os três momentos por que passam a história, o conhecimento e mesmo a natureza em seu desenvolvimento são: tese (ser, afirmação), antítese (não ser, negação) e síntese (vir a ser, superação ou ultrapassagem). Essa espiral crescente e transformadora mostra que não é por acréscimo que há mudança e sim por superação de dois momentos ou movimentos antagônicos reunidos em um terceiro momento em que a totalidade da história muda.
Mas Hegel não se limitou a esse esquema, e, é claro, nunca pretendeu com isso chegar à revolução do proletariado...

O que significa a mudança por contradição?
Que a negação é inseparável das determinações, do ser isso ou aquilo. Para algo ser determinado, isso requer ao mesmo tempo que ele não seja isso ou aquilo. A verdade reside na passagem, no devir. Quer dizer, a marca característica de algo, ser de tal ou tal espécie, implica diferença. Mas se é preciso a diferença, como se conhece tal espécie? Não é pela identidade?

Enquanto Kant resolve o problema pela fixação por meio de conceitos, pelo juízo que afirma, nega, contrapõe, etc., pelo recurso do entendimento às categorias imutáveis, puras a priori da razão, para Hegel isso levaria a um abismo entre o sujeito que representa o mundo e a realidade representada. Haveria dois momentos, o da apercepção do sujeito e o daquilo que ele conhece. Se o em si é incognoscível a consequência é o ceticismo, pois não é possível conferir ou confrontar representação com representado, seria preciso alguém ou algo de fora para "juntar" os dois momentos, os recursos para conhecer e o que é conhecido.
Para Hegel não há essa distância, a realidade em si pode ser apreendida, sensações que se tem e ideias ou conceitos são momentos que não se justapõem e nem se excluem, mas se complementam. Não por força do sujeito com sínteses transcendentais, mas do sujeito em relação permanente com as coisas em recíproca influência e modificação pelo uso da linguagem em proposições nas quais entram categorias e conceitos.
As proposições não são pura síntese, pois foram forjadas pelo próprio movimento histórico que pretendem explicar. Isto é, a história é o espírito humano se manifestando. Conceitos são criados e modificados. Quando se formula um juízo a respeito de algo há um uso, há a responsabilidade por conferir a apropriação ou não desse uso em um contexto. Em suma, há a preocupação pela correção do uso de uma proposição. As coisas são como o juízo afirma que elas são? Podemos conferir se sim ou não.
Como se vê, Hegel não se resume ao "método" dialético.

Se Kant não tivesse feito a mais radical crítica à metafísica (não se pode conhecer o noumeno ou algo em si mesmo e enquanto tal, só os fenômenos, o que se apresenta e como se apresenta ao conhecimento), Hegel não precisaria ter se esforçado tanto para recuperá-la. O em si e o para si não podem se divorciar, do contrário não haveria formas culturais de vida, a vida social e a construção do conhecimento da realidade são formas de o espírito operar sobre as coisas e de estas serem percebidas, ditas e usadas.
Esse duelo de gigantes, Kant X Hegel, é retomado por Habermas. Isso fica para a próxima postagem.

2 comentários: