
Um ato de fala requer, portanto, conteúdo proposicional quando se trata de afirmações sobre algo que o ouvinte compreende e sabe a que se refere. Atos de fala têm validez, quem faz uma promessa, por exemplo, implica intenção sincera de cumpri-la, do contrário ela se torna um ato de fala vazio. Pedir informação pressupõe condições de validez, como ser relevante e obter resposta do ouvinte (que tem ou não condições de informar). E assim por diante em nossa vida cotidiana: nos comunicamos.
De outro lado, pode-se agir estrategicamente, impondo, influenciando, negociando. Nesses termos a ação tem a ver com o poder de barganha, de convencimento, como na política, na propaganda, no comércio, no mercado.
Onde entra Kant?
O transcendental passa a habitar a linguagem que é uma prática aprendida, conhecer e lidar com o mundo dependem dela, os atos de fala são necessários, mas não puros, nem a priori. Habermas "destrancendentaliza" a razão por meio da comunicação linguística.
Onde entra Hegel?
Se a linguagem é aprendida, isso depende da cultura, de sua evolução histórica e das necessidades que nascem de situações concretas. Como resolver problemas, como enfrentar obstáculos, como realizar obras? Hegel "historiciza" a razão e dá ao entendimento funções, o espírito humano se concretiza nas religiões, na arte, na filosofia. Por meio do trabalho, da linguagem e da ação, o espírito desempenha suas tarefas em direção a maior liberdade e plenitude. Direito, ética, o funcionamento pleno da sociedade civil, nada disso depende de imperativo categórico puro, e sim de transformações históricas.
Habermas concorda com tudo isso. O problema é que Hegel entende que esse processo dialético é unidirecional, que ele culmina no Espírito Absoluto, plenitude e realização máxima de seu caminhar histórico.
Para Habermas a ação comunicativa não tem fim. Ela envolve argumentação, pessoas capazes de usar a razão socializada por meio do aprendizado de atos de fala. Os participantes integram uma comunidade ética, política, social. O ideal para Habermas não é culminar em uma totalidade abstrata, e sim a concretização do dar e ouvir razões, em comunidades de comunicação ilimitadas, que negociem e conciliem interesses e valores, cujos membros sejam suficientemente educados e seus propósitos sejam os de inclusão do maior número possível de pessoas. Quer dizer, democracias que respeitem o estado de direito, sendo "a consciência da solidariedade cosmopolita obrigatória" diz ele em A constelação pós-nacional (2001).
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