Uma das frases mais famosas da História da Filosofia é a de Nietzsche em seu anúncio da morte de Deus. O que isso significa, por que escandaliza e faz dele um autor "perigoso"?
Há que compreender as razões, o filósofo se considera o "primeiro imoralista", que dizer, destruidor de ídolos a marteladas, como o deus Dionísio, deus do devir, das transformações, inspirador da arte. A recusa de um ideal e pôr em seu lugar o real, livrar-se do sufoco da fé que cega, caminhar por si, com suas próprias forças, superar as dificuldades por meio de sua vontade, esses são os meios para a vida, uma luta em que se conta com as condições terrenas, com a capacidade de reagir. Isso Nietzsche experimentou com o sofrimento por doença, dores de cabeça terríveis, mas ele reagiu e assim se tornou mais forte.
Fraqueza seria renunciar ao que podemos contar aqui, com as condições que se nos apresentam, as condições da terra, o que terreno fortalece, ele põe a vida em lugar do mundo espiritualizado, da cultura banalizada.
Os espíritos livres são doadores de sentido, isso torna compreensível o slogan "Deus está morto", que implica na recusa de desejar alguém que mande, "um Deus, um príncipe, uma classe, um médico, um confessor, um dogma, uma consciência partidária", afirmou Nietzsche. É um adoecimento da vontade esse "tu deves", o fanatismo que hipnotiza os fracos e inseguros, o sentimento de culpa, o medo, o temor da condenação da alma. Essas são convicções, não ocorre às pessoas livrar-se desses sacrifícios para resgatar sua liberdade e autoconfiança. Quanto menor for a vida vibrante e atual, maior a necessidade de Deus salvador, das promessas da vida eterna.
Para ele, a morte de Deus representa o maior dos acontecimentos, a morte das crenças e da moral europeia, essa morte seria uma nova aurora, caminhos abertos para navegar e enfrentar todo perigo, sem a tortura do mal e do pecado, quando o que se tem é a natureza humana, em que há sofrimento. A não aceitação do sofrimento produz o desejo de redenção, de salvação, resultados do orgulho humano, de o próprio homem se considerar um Deus.
Como seria então para Nietzsche uma vida vibrante e "terrestre"?
A busca do autocontrole, do silêncio e solidão, como ele próprio gostava, caminhar, contemplar do alto de montanhas . O mesmo acontece com o homem comum quando busca a paz de espírito, a nobreza da aceitação, do "é assim mesmo", a necessidade da elevação de si, a compreensão de que suportar o mundo real não é uma condenação que precisaria da redenção à vida eterna para a alma imortal. Importam as condições do mundo real.
Nietzsche apreciava caminhar no silêncio e solidão de Sils Maria, pequena cidade Suíça.
Para quem pensa é mesmo indelicado supor Deus, um obstáculo para todos aqueles que não veem sentido algum na salvação; faz sentido alimentar a vida, dançar, alegrar-se, dar valor ao corpo, aos desejos, livrar-se do sentimento de culpa, os desejos não são impuros.
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Ser "espírito livre", deixar o rebanho, parece cada vez mais complicado. Em nossos dias vemos hordas e mais hordas a gritar e a ameaçar, pessoas que veneram não só ídolos, mas o ideólogo do momento, o partido do momento, o retorno ao poder, o guru da moda. O grande perigo, afirmou Nietzsche, e isso vale inclusive para a atualidade, é quando a religião não opera para educar, disciplinar e passa às mãos obcecadas de tiranos que consideram sua crença como superior, única e suprema verdade. E, em nome de sua crença, perseguem, castigam, oprimem e matam.
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