quarta-feira, 10 de novembro de 2021

"O ser humano se tornou coisa entre coisas"

Basta a leitura de algumas páginas de um jornal de algum canto do mundo, basta visitar um site de notícias, ou entrar redes de relacionamento, buscar informação, ler algumas páginas de um livro de História, pode ser da América, da Europa, da Ásia ou da África - e o que poderemos constatar, ao menos por meio de uma reflexão filosófica?

Que o ser humano se tornou coisa entre coisas, esqueceu do ser. Como assim? O ser humano precisa ocupar-se com as coisas, lidar com elas, transformá-las, utilizá-las do contrário ele perece. Sim, imprescindível a necessidade de sobrevivência, e é isso que se vê o tempo todo, em todo lugar. As necessidades não são satisfeitas pela busca do ser, talvez pela busca por liberdade e um pouco menos pela verdade.

Se a questão é a sobrevivência, qual é o sentido dessa afirmação, de termos esquecido do ser e nos tornarmos coisas?

O trabalho ao mesmo tempo em que sustenta, nos aliena. Um exemplo simples e notório: os entregadores que se multiplicaram com a pandemia e que precisam enfrentar o trânsito, lutar contra o tempo e chegar ao destino para ganhar alguns trocados. Faz sentido afirmar que o entregador esqueceu do ser? Nada mais estranho e absurdo, ele precisaria ser filósofo para não esquecer do ser?

Evidente que não. O entregador com sua moto ou bicicleta pertence ao mundo das coisas, dos negócios, do trabalho, da subsistência, faz parte da engrenagem social e econômica. É assim na modernidade muito mais do que em épocas pré-industriais. Nosso compasso é o da medida, da técnica, do consumo, da ultra especialização, do cálculo. Impossível a vida humana sem máquinas e tecnologia. 

Então, mais uma vez, faz algum sentido afirmar como Heidegger que esquecemos do ser? Qual o sentido da vida, ou, em termos conceituais, qual o sentido do ser? Seria a capacidade de ir além, algo como a busca do eterno no homem, esse eterno seria o ser que em meio às coisas nos desperta para a arte, o poético, o brilho nos olhos que vem da inspiração, da invenção, da abertura que deixa entrar certa luz, quando se é tomado pela sensação de uma presença, algum tipo de epifania, quando parece que tudo se ajusta, que o quebra-cabeças foi resolvido. A abertura para o ser é uma sintonia, uma sinfonia, uma revelação

A cada ser humano é dada a possibilidade de entender e de se fazer entender, como pelo grito de protesto, na tomada de uma difícil decisão, ao expor seu sofrimento, ou na explosão de alegria. 

São várias as maneiras de nos integrarmos ao ser, de comemorarmos a vida, de colocarmos o eterno em nossos corações e sair um pouco das engrenagens. Movimentos difíceis e raros. Os obstáculos são os de sempre: poder e cálculo de poder, mentira, violência, crueldade, falsidade, fanatismo. 

Urge abrir horizontes, essa é a questão do ser para Heidegger, é isso que precisa ser compreendido como uma música que soa ao longe e que apenas nós, seres humanos somos capazes de criar e de usufruir. 



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