terça-feira, 14 de maio de 2013

As críticas de Habermas ao marxismo

O método dialético de Hegel foi aplicado por Marx à história dos modos de produção, que foram: escravagista, asiático, feudal, mercantilista, até chegar ao capitalismo. Essas transformações ocorreram pelo esgotamento do modelo, as contradições a eles inerentes levariam aos chamados "saltos de qualidade". Para o marxismo, isso significa que o capitalismo, tal como os anteriores, contém nele mesmo contradições que são o germe de sua própria destruição. Marx se referia ao capitalismo que nascera em sua época, o século 19.
As condições do capitalismo e da classe dos trabalhadores eram aviltantes. A solução seria uma revolução, uma classe revolucionária conduziria a mudança para o socialismo, e futuramente o comunismo com a abolição da propriedade privada dos meios de produção. 
Alguns países passaram por essa revolução com alto custo, perda de vidas, de liberdade, de representação social e política. E outras mudanças viriam: crise financeira (1919), duas guerras mundiais, a explosão da bomba atômica, a guerra fria, a descolonização da África; e, na segunda metade Europa e EUA expandiram a indústria com sofisticação crescente da tecnologia. As revoltas operárias e a revolução comunista ficaram para trás, o muro de Berlim caiu, a China ressurgiu como segunda potência mundial. A pobreza, principalmente no hemisfério sul não cedeu, pelo contrário. Esses países passaram a depender do mundo desenvolvido, o qual passa por nova crise financeira. 
O que aconteceu com a revolução dos trabalhadores, com a revolução comunista? Cada vez mais restritas às bandeiras de esquerda em alguns poucos países. E ainda persistente no discurso acadêmico, no Brasil apadrinhada pelo discurso pedagógico, pela cartilha do MST, presente nos livros didáticos de história que insistem em ideologizar. Sintomático que esse discurso tenha desaparecido da CUT e do PT tão logo o partido assumiu o governo. Há uma evidente incompatibilidade entre governar e levar a sério as lições do marxismo. 

"Hoje em dia, escreveu Habermas, certamente o portador de uma transformação, à qual Marx deu tanta ênfase, não é mais a burguesia de 1848, nem determinada classe social que domina o quadro nacional, mas um sistema econômico anônimo que opera em nível mundial e que não está ligado a estruturas de classes identificáveis facilmente" (Diagnósticos do Tempo, p. 137).

Ao se comparar a situação de operários de Manchester na Inglaterra do século 19, a exploração e o sofrimento deles nos primórdios do capitalismo com as condições atuais, notam-se inúmeras transformações. Entre elas a aplicação mais equânime da justiça, condições melhores de trabalho e outros tipos de reivindicação: no lugar de uma revolução socialista, acesso aos bens de consumo, conforto, saúde, escolas de qualidade e gratuitas para os filhos, melhor salário, participação nos lucros das empresas, habitação digna, transporte, e mesmo lazer. É verdade que grande parte da população mundial não tem acesso a esses bens e a condições mínimas de sobrevivência. Expandir a riqueza e ao mesmo tempo distribuí-la cabe a governos e não a banqueiros ou financistas! Isso ficou evidente com a crise desencadeada em 2008 pelo capitalismo financeiro e pela ganância, o lucro alto, imediato e fácil. No lugar de "dissolver" o capitalismo (ele é dissolúvel?!), a questão tem sido até que ponto o Estado e governos devem e podem intervir na economia de um país.

Para refletir: a ideologia marxista, a pregação de uma revolução de classe, a própria noção de classe social, esconde modificações históricas sistematicamente ignoradas. O que é exatamente "ter consciência de classe"? Se as representações sociais fossem influenciadas por essa consciência, como poderia surgir no seio da sociedade de classes, a classe revolucionária? A consciência revolucionária teria que nascer fora da própria sociedade. E mais: os países socialistas foram forjados por uma classe revolucionária? O que aconteceu quando essa classe assumiu o poder na ex-URSS, na China, em Cuba?

A esquerda marxista "tem um conceito estreito de práxis", diz Habermas. Se a prática social se limitasse às relações econômicas de produção, a vida em sociedade seria pautada apenas pelo mercado. Por mais poder que este tenha, há o outro lado, outros tipos de práticas sociais. As sociedades modernas asseguram direitos e deveres de cidadãos, as obrigações valem para todos; o racismo passou a ser crime; surgiram novas representações políticas. As demandas são pelo acesso à educação e à informação, a valorização da produção cultural, das artes; as reivindicações das minorias; a liberdade de credo e culto. Nada disso pode ser reduzido à "consciência de classe".
E mais, os aspectos de realização pessoal, a busca por uma vida satisfatória e plena, a ética em nossas ações. Nada disso lembra ou depende da práxis de uma classe revolucionária.

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