Prefiro chamar de "velhice" e não de "terceira idade" pois essa expressão soa mais como um eufemismo com conotação médica, de vida saudável, bailes, excursões, dominó na praça. Velhice é muito mais do que distração, é reinvenção, nova visão de si, do alto e do todo. Não é sinônimo de fenecimento, decadência. Representa o reconhecimento do que se foi e do que se é, leva a novos e surpreendentes projeto e realizações.
A idade é propícia para perguntas, por que fiz ou deixei de fazer, onde falhei e onde fui bem-sucedido/a, essas avaliações dão à vida novos sentidos. É como se nos tornássemos personagens para nós mesmos.
Nem todos têm a ventura de se saberem presentes, de agarrarem o tempo, de se situarem. Alguma doença, falta de recursos, falta de perspectiva são empecilhos. Desistem de viver, se acomodam em uma cadeira, fixam o olhar e se abandonam. Não houve chance de mudarem o curso em direção ao sol, à poesia do mundo, às revelações, às descobertas não necessariamente do grandioso, pois o grandioso pode ser encontrado no banal.
A todos aqueles que têm a ventura de se saberem presentes, de agarrarem o tempo, de se situarem, a todos os que na velhice possuem a clareza de espírito, a capacidade de caminhar, de contemplar e ver sentido em detalhes ou no vasto céu, de sair do círculo fechado do eu, esses conseguem sorver o privilégio de ter atingido a fase final.
O que cada um deixará, legará como herança, não em bens necessariamente, será mais precioso se com suas visões, valores e experiências; estas perduram, certamente o olhar dos que ficaram pousará na foto que servirá como lembrança não com dor, mas com alento, inspiração, uma saudade que vibra.
Mirar para o passado, para o que a pessoa experimentou, leva a avaliar ou a reavaliar o que causou sofrimento e pode ser transformado em compreensão, certo acontecimento não terá sido assim tão grave e nem tão espetacular. O passado é posto em seu devido lugar, e esse é um dos benefícios mais preciosos da velhice.
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Vincent Van Gogh morreu aos 37 anos, impossível saber em que pessoa ele teria se tornado ao envelhecer. Seus quadros, entretanto, bastam para nós, como as pinturas com o tema dos girassóis. Foram várias com o tema. Pode-se ler o movimento chamado "heliotropismo" como metáfora da vida. Nos direcionamos para o sol e nos fecharemos com o cair da noite.
Para uma análise completa do simbolismo do girassol na pintura, ver The cryptic symbolism of Van Gogh's Sunflowers, in: BBC, 26.06.2025.
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