quinta-feira, 22 de julho de 2010

Educar e/ou punir

Kant (1724-1804), filósofo alemão, marcou a diferença entre público e privado em um dos escritos mais brilhantes da história da filosofia (O que é a ilustração). Pensar por si mesmo é sair da dependência, da tutela, seja ela qual for. Um público esclarecido, se for dada a ele liberdade, é capaz de fazer uso público da razão, de questionar e decidir.
Falar em nome de sua própria pessoa difere de se manifestar enquanto assume um cargo ou uma posição notória, pois isso exige o cumprimento de leis e de regras. Exemplo: um sacerdote pode dar sua opinião pessoal a respeito da proibição da Igreja Católica de usar preventivo nas relações sexuais. No púlpito, para o público, deve respeitar a doutrina católica.
Essa distinção entre público e privado importa e muito na atual discussão sobre legislar ou não em matéria da vida privada. O estatuto da criança e do adolescente deve oferecer proteção legal. Abuso, violência, devem ser denunciados e punidos? Sim!
Mas, até que ponto dar palmadas nos filhos (as) é ação privada que deve ser regrada e punida por instrumentos públicos? Como e quando intervir e punir? E por que?
Na década de 50 a repreensão era com palmadas, cintadas (!) e uma vara de marmeleiro poderia ser usada em caso de desobediência.
O que mudou? A percepção da família pelo Estado, o papel da família como núcleo exemplar, como sustentáculo do bom funcionamento do governo, como exigência social e moral de um lugar asseado, de correção, de proteção, de educação, de prevenção de todo e qualquer desvio.
O que os pais e mães devem fazer é policiado para evitar violência social. E evita?
A punição deve ser não violenta (castigue, limite, mas não bata): essa é a mais nova injunção do setor público sobre o privado. Mas e quando a criança sofre ameaça verbal? Fica com medo, insegura. A legislação deveria também proibir ameaças!?
A distinção de Kant está borrada. O Estado, a economia, a sociedade e os governos regram a conduta das famílias. A própria família aceita de bom grado a vigilância.
O ideal seria que pais assumissem a responsabilidade pela melhor educação possível, que soubessem discernir com equilíbrio e amor o modo como educam e, eventualmente, como punem. Uma questão crucial: se há necessidade de punir, isso já não é sintoma de que algo vai mal ?
A sabedoria dos pais deveria valer mais do que regras e códigos ...

domingo, 11 de julho de 2010

A boa vontade não custa nada

Algo que chamou a atenção no caso do goleiro Bruno, foi a imprensa de modo geral voltar-se para o efeito sobre os pequenos torcedores do Flamengo. Para os fãs o jogador é bom, mais do que bom de bola, um herói.
Ora, suspeito de assassinato, ele se transformou em vilão. Como entender o mal? Como explicar que um ídolo faça o mal?
Para Hobbes o homem quer devorar o próprio homem, em uma eterna luta. Para Rousseau, ao contrário, o homem nasceu bom, a sociedade é que o corrompeu. Freud também culpou a civilização por bloquear os impulsos.
Uma visão diferente acerca do mal, é a de Santo Agostinho. O mal não é uma coisa, portanto não depende de Deus, não é algo criado. O mal vem da vontade que é livre. Há o livre arbítrio, a livre escolha, ou então não é mais vontade. Mas como pode a vontade escolher matar alguém que tem nos braços um filho seu?!
Quando falta força, quando a decisão abandona a fortaleza, a coragem, as virtudes pelas quais se consegue vida plena, vida feliz, é a própria vontade que assim agiu. Mas não a boa vontade.
Cultivar a boa vontade é difícil, requer sacrifício, luta, empenho, boa educação, hábitos cultivados desde cedo, pela pessoa, única responsável pelos seus atos. De nada adianta encontrar culpados, ou desculpas. Ele foi fraco porque, coitadinho, não teve chance, a sociedade é que é má, os pais o abandonaram, etc. etc.
A disposição para agir bem depende da vontade que extrai dela mesma a força para se encaminhar, ou seja, encontrar seu caminho.
Pode-se perder a fortuna, amigos, a saúde, mas a boa vontade depende apenas de nós, ela nos pertence, é gratuita, basta que a reconheçamos e que tenhamos a força moral necessária para cultivá-la.